Acordei no exato momento que o trem estacionou. Olhei
rapidamente pela janela, ainda embaçada pelo frio que fazia e percebi que havia
chegado ao meu destino: Vila Verde. Tinha imaginado como ela seria: uma cidade
grande, cheia de árvores, gelada. Poucas vezes em minha vida adivinhei tão bem.
Recolhi meus pertences e desci. Lá estava minha tia toda
sorridente no terminal. Ao me ver, logo acenou. Corri em sua direção.
- Sara! Abraçou-me.
- Tia Carmen. Retribui.
- Sarinha, minha sobrinha favorita!
Virei e vi que era Eddy. Abracei com muita força. Amava tio
Eddy. Era o pai que nunca tive, mas quando percebi que estava pensando no
motivo que me trouxe, logo o soltei.
- Demorou muito, filha.
- Eu sei, foi por que houve um problema na maquinaria.
- Que azar! Espantou-se minha tia.
- Mas é melhor irmos, pois está muito frio aqui.
Entramos no carro, um calhambeque amarelo com vinte anos de
idade, muito amado pelo meu tio. Partimos em direção a minha nova casa. A
cidade era muito vegetativa, com árvores e jardins em toda parte, sendo
inacreditável tal paisagem num mundo onde derrubam florestas por tão pouco e
nada mais que o dinheiro importa.
- Como está sua mãe? Perguntou tia Carmen.
- Trabalhando muito.
- Ainda está com aquele demônio?
- Não. Ele finalmente nos deixou em paz.
- Graças a Deus. Orei muito por isso.
- Obrigada. Foi algo de Deus mesmo.
- Você vai adorar Vila Verde, querida. Exclamou tio Eddy todo
sorridente, me olhando através do retrovisor. Ri.
Continuei olhando pela janela e percebi que a cidade nem era
tão grande em si, porém possuía muitas regiões naturais. Deduzi o porquê do
nome Vila Verde. Havia ainda a floresta Branca. Minha mãe havia me dito que a
vila foi construída numa parte dela, e como ficava antes da entrada da mesma,
não cheguei a vê-la.
Vi, em seguida um grande banner com a seguinte propaganda:
“Dê as seus filhos a melhor educação. Coloque-os no Instituto Richard Caned.”
Tinha ao fundo a imagem duma escola muito bonita, com um senhor de
aparentemente quarenta anos, de terno preto e gravata listrada vermelha e
branca, acenando.
- Quem é este?
- É um empresário famoso que resolveu tentar a sorte
aqui, perturbando toda nossa cidade. Respondeu de mau humor. Notei então que
tio Eddy não simpatizou nem um pouco com aquele homem.
- O instituto dele é o melhor de toda região. Você e
Bia irão estudar lá... Contradisse minha tia.
Bia? Eu odiava
Beatriz! Ela era filha do primeiro casamento de tia Carmen. Era extremamente
mimada e nojenta. Odiamo-nos desde pequenas.
-... O novo ano letivo, inicia-se
depois de amanhã.
- Que dia é hoje mesmo?
- Sábado, 23 de abril. Respondeu tio Eddy.
- Legal. Estamos muito longe de casa?
- Uns quatro quarteirões.
- Até que a casa é longe.
Nesse momento
Sara meio que se deitou no banco, retornando a olhar a vista noturna além da janela.
Estavam atravessando a Rua Osborne.
- Socorro! Socorro! Alguém gritou.
- O que é isso? Exclamei.
Tio Eddy estacionou o carro e saímos. O pedido de
ajuda veio de um grupo com cerca de cinco jovens, no qual uma estava deitada
num banco da praça.
- O que
houve? Perguntou tia Carmen.
- Ela está passando mal e não sabemos o que fazer!
Respondeu um deles desesperado. Era um jovem alto e moreno.
- Ó Jesus! Disse tia Carmen e correu em direção
dela. Segui atrás.
Minha mãe sempre quis que eu fosse médica e de fato
eu o queria. Não sei dizer se era por vontade própria ou por ela. Mas me
dediquei a fazê-la feliz, coisa que o monstro do meu pai nunca fez.
- Posso levá-la para o hospital. Sugeriu tio Eddy
nervoso.
Aproximei-me dela e notei que estava inconsciente.
Todos estavam muito nervosos, mesmo assim consegui manter-me calma.
- Ela está respirando? Perguntou uma outra jovem,
branca de cabelos castanhos.
- Não, mas tem como fazer uma massagem cardíaca.
- Ai meu Deus! Gritou alto um outro rapaz que estava
atrás de mim.
Meus tios estavam apenas me observando, apreensivos
com minhas atitudes.
- É melhor leva-la para o hospital!
- Deixe a menina ver o que pode fazer!
- Ela é médica por acaso?!
- Anderson, por favor, não comece!
- Ele tem razão, Leandro. Concordou a menina branca
de cabelo castanhos.
Minha tentativa de reanima-la foi bem sucedida. Ela
despertou. Percebi também que quem nos pediu socorro, chamava-se Anderson.
- Jennifer! Graças a Deus! Gritaram todos de uma
vez. Admirei-me com isso.
- Você me é familiar. De quem é filho? Indagou meu
tio ao tal Leandro.
Ele sorriu meio desconfiado, como quem ficou
incomodado com a pergunta e foi embora. Aos poucos todos foram se indo,
inclusive a Jennifer.
Fizemos um breve momento de silencio vendo-os ir
como quem havia cometido um crime.
- Foram embora sem nem agradecer?! Indignou-se tia
Carmen.
- Pois é!
- Deixe pra lá. É melhor irmos pra casa. Respondi.
- Tem razão, querida. Jesus nos recompensa.
Minha tia era católica praticante e fervorosa, assim
como minha mãe. Logo após fomos para casa.
Assim que chegamos, fomos recebidos por Beatriz.
Notei que estava diferente da ultima vez que a vi. Estava mais gordinha,
aparentando estar acima do peso de sua idade e muito mais branca. Assim que me viu
fez uma enorme cara de nojo.
- Não acredito que foi esse diabo que foram buscar,
Carmen! Se soubesse teria dado um jeito de viajar.
Pensei em revidar, mas como era o primeiro dia,
abaixei a cabeça e fiquei quieta.
- Bia, querida, não fale assim com sua prima.
- “Please” Carmen, “Please”.
Como poderia esquecer esse detalhe? Beatriz era obcecada em falar algumas coisas em inglês. Sabia praticamente nada, mas a
insignificante quantidade que conhecia não ousava parar de repeti.
- Chame sua mãe com respeito, por favor.
- Olhe Eddy, você não é meu pai, portanto não devo
satisfações a você.
- Bia! Repreendeu sua mãe.
- Quero chocolate quente. Faça antes que eu durma!
Após isso entrou na casa. Tia Carmen seguiu atrás.
Fiquei imaginando como este ano seria doloroso para
mim. Conviver com alguém tão irritante assim, seria uma experiência de
enlouquecer ou eu poderia perder toda minha sanidade e mata-la. Dei algumas
gargalhadas quando considerei a ideia de mata-la.
- Quer ajuda com as malas, Sarinha?
- Claro.
Não gostava muito do apelido, mas como era de alguém
que amava muito, não me importava. Levamos as coisas para o que seria agora meu
quarto. Assim que terminamos, tio Eddy despediu-se e foi dormir. Desci pra
beber água. Na cozinha estava Beatriz sentada tomando chocolate quente. Pra ser
sincera, quando vi, fiquei com vontade de pedir para experimentar. Nunca havia
tomado chocolate quente.
- Humm... Está tão bom.
Seu tom era irônico. Sabia que era para me provocar.
Ignorei-a, despedi-me de tia Carmen e subi para meu quarto.
Estava com uma calça jeans cinza e uma blusa preta.
Quando fui trocar-me diante do espelho, percebi que havia algumas manchas
brancas, como que causadas por um pó de mesma cor.
- Onde eu sujei?
Quando comecei a pensar nas possibilidades,
lembrei-me dos jovens e da menina que ajudei.
- Será que era droga? Pensei, mas abismei-me em
considerar essa hipótese e terminei de me trocar.
Escutei o som do meu celular vibrando. Ao pegá-lo,
vi que minha mãe me ligava.
- Mãe? Atendi.
- Oi querida.
- Deu tudo certo. Estou na casa de tia Carmen.
- Graças a Deus, filha.
- Já estou morrendo de saudades e tenho consciência
que sofrerei muito aqui.
- Sofrer?
- É. Beatriz é insuportável.
- Você sabe como é sua prima, mas mesmo assim
resolveu ir.
- Sim. Quero um futuro melhor para nós. John errou
muito conosco.
- Admiro isso em você e somente o Senhor Deus sabe
como fico contente em tê-la como filha.
A conversa estava começando a me deixar emotiva. Já
sentia algumas centelhazinhas de água em meus olhos.
- Eu amo a senhora. Foi sempre muito boa comigo.
- Também te amo.
- Infelizmente vou ter que desligar. Amanhã tenho
que acordar cedo.
- Boa noite, querida.
- Mãe antes de desligar, quero dizer que...
- Que?
- Eu prometo que vou conseguir mudar nossa situação.
- Ô Sara, sempre preocupada... Sei que sim.
- Boa noite então.
- Boa. Desligou sua mãe.
Coloquei o celular na cômoda e deitei. Fiquei
pensando no que me esperaria nesse instituto. Será que vou fazer amigos? E
inimigos? Como são os que estudam lá? Mas acima de tudo sabia que aproveitaria
todas as oportunidades de vencer na vida. Nesse clima adormeci.
É uma história muito interessante...
ResponderExcluirporém há muittas palavras desconectas como: "estacionou,banner ao envés de out-door,a palavra pedir é desnecessária"...
Fica a dica
Obrigado pelo comentário.
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